BRASILAGRO – 03/07/2019
Quem trabalha com o agronegócio ou tem apenas o interesse de acompanhar como anda a economia do País já sabe que o setor agropecuário vem sustentando o Brasil, há um bom tempo, principalmente em época de crise financeira. Mas basta uma notícia replicada sem embasamento científico, especialmente as relacionadas com o uso de defensivos agrícolas, ou até mesmo a veiculação de uma “fake news” nas redes sociais para que toda essa atuação seja colocada em xeque.
Diante da desinformação, a sociedade de modo geral geralmente taxa a agricultura e a pecuária como as grandes vilãs do meio ambiente. Para mudar esse cenário, vem cabendo ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) provar, aqui e lá fora, que a produção agropecuária brasileira é uma das mais sustentáveis do planeta.
Essa análise foi unânime entre os palestrantes do 3º Fórum Internacional Inovação para Sustentabilidade na Agricultura, realizado na quinta-feira, 27 de junho, em Brasília (DF), e que trouxe como tema “Modernizar para garantir a segurança”.
Antes da realização dos três painéis e do debate final mediado pelo jornalista William Waack, o presidente do Conselho Diretor da Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), Eduardo Leduc, fez uma breve explanação sobre a importância de debater a inserção de novas técnicas e tecnologias na agricultura, associadas às boas práticas agrícolas.
Em sua opinião, para que a agricultura seja cada vez mais sustentável e que receba o apoio da sociedade em geral, “é necessário realizar um trabalho em conjunto entre agências reguladoras, institutos de pesquisa, produtores rurais, governos, entre outros”. Também comentou sobre o trabalho de comunicação de jornalistas para que faça essa ponte entre o campo e a cidade.
Mais considerações
Durante a abertura, o presidente do Conselho Diretor da CropLife Latin America, Valdemar Fischer, pontuou os desafios da produção de alimentos no Brasil e no mundo, considerando o crescimento populacional no planeta.
“Nesse cenário, cabem duas palavras importantes: inovação e sustentabilidade. Mas como suprir essa demanda global atendendo a países que compram produtos do Brasil. Os Estados estão fazendo isso de forma brilhante e estão mudando a narrativa da agropecuária, produzindo alimentos de maior qualidade e fazendo jus ao trabalho do agricultor, da indústria e da pesquisa em nosso País”, salientou Fischer.
Representando o Ministério da Agricultura, o secretário Fernando Camargo, que está à frente da Secretaria de Inovação e Desenvolvimento Rural, destacou a importância “deste duo ” inovação e sustentabilidade ” para a agricultura, que tende a plantar mais sem aumentar a área de cultivo e sem destruir a natureza”.
Para auxiliar os produtores rurais e outras áreas que envolvem o agro brasileiro, ele anunciou, em primeira mão, a criação de um grupo de trabalho interministerial, a princípio, chamado de “Câmara da Agricultura Digital ” Agricultura 4.0″.
Ciência e tecnologia
Secretário de Radiodifusão do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Elifas Chaves Gurgel do Amaral, que já presidiu a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), disse que “a ciência e a tecnologia tem de vir ao encontro da qualidade de vida para os cidadãos”.
“Além de qualidade, é fundamental para saúde ter mais tecnologia no campo, por meio das telecomunicações e especialmente com a disponibilização de pontos de acesso à internet para os produtores rurais, permitindo o aumento da produtividade do setor e facilitando a vida do agricultor”, disse o executivo, acrescentando que “a informação é a melhor ação no sentido de contribuir para que as pessoas tenham certeza de que seu alimento é de qualidade”.
Polêmica sobre agrotóxicos
Interino no maior posto do Ministério da Agricultura, considerando que a titular ” a ministra Tereza Cristina ” estava em viagem ao exterior na ocasião do Fórum, o deputado federal Marcos Montes destacou o imbróglio envolvendo a liberação de novos defensivos agrícolas no Brasil.
“Precisamos mostrar ao mundo que aqui se tem a maior agricultura em tamanho, mas também em responsabilidade. Precisamos derrubar o discurso meramente ideológico que desinforma as pessoas sobre os nossos alimentos. Um dos maiores empecilhos às exportações brasileiras é esta imagem que insistem em fazer de nós, lá fora. São teorias ideológicas de quem não quer o Brasil competitivo”, criticou o parlamentar.
Montes ainda mencionou a parceria entre Mapa, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que envolve, principalmente, as avaliações técnico-científicas de agroquímicos recentemente aprovados para uso no Brasil.
Em sua visão, nesse sentido, é importante que os órgãos competentes ofereçam maior agilidade na hora de “contrapor as notícias falsas em torno do assunto e mostrar que os alimentos brasileiros são excelentes para o consumo”.
Ele ainda citou a tramitação, no Congresso Nacional, das sugestões de mudanças de vários pontos da chamada “Lei dos Agrotóxicos” ” Projeto de Lei nº 6.299, de 2002 “, que devem modernizar a legislação que envolve a produção agrícola do País.
Agrotecnologias na segurança alimentar
Dando início às palestras, ao ministrar o debate sobre “O papel das agrotecnologias na segurança alimentar”, o presidente executivo da CropLife Latin America, José Perdomo, comentou sobre os avanços na proteção de culturas agrícolas, de forma sustentável e especialmente via controle biológico; nos investimentos ano a ano em pesquisa e desenvolvimento (P&D); no crescimento das indústrias e da ciência; entre outros temas.
“As tecnologias garantem maior produtividade e maior eficiência, com menor toxicidade e doses mais baixas [de agroquímicos] por hectare”, ressaltou.
Para o executivo, “o uso das agrotecnologias é uma responsabilidade compartilhada” e se faze necessário que elas cheguem ao pequeno produtor, “que ainda usam pouca tecnologia, levando informação e dando acesso a eles”, considerando que “50% da comida do planta é fornecida pelo pequeno produtor, que somam mais de 500 milhões no mundo”. “Nos países em desenvolvimento, esse dado pode chegar a 80%.”
Uso e riscos dos defensivos agrícolas
No segundo painel do Fórum Internacional Inovação para Sustentabilidade na Agricultura ” “Brasil: informando corretamente sobre o uso e os riscos dos defensivosa agrícolas” “, Caio Carbonari, professor doutor da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) do Campus Botucatu, trouxe dados que atestam que o Brasil não é maior usuário de agroquímicos do mundo.
“Trata-se de um tema polêmico, sensível, até porque existe muita desinformação sobre nossa agricultura”, ressaltou o docente, mencionando números importantes: o plantio direto no País, considerado mais sustentável, é utilizado em 32 milhões de hectares; com duas safras por ano, há uma otimização do usos das áreas agricultáveis; o cultivo mínimo em áreas florestais chega a 7,8 milhões de hectares; o cultivo de cana-de-açúcar sem a queima já contabiliza oito milhões de hectares.
“A agricultura brasileira tem papel estruturante na estabilidade da economia e isso evidencia nossa qualidade produtiva”, comentou o professor, após citar que o “superávit do agro tem sido fundamental para a estabilidade da balança comercial” do País.
Para ele, “cabe à sociedade como um todo garantir que a agricultura continue tendo acesso às tecnologias”. “Mas qual é a melhor forma de comparar o uso de defensivos agrícolas” entre o Brasil e o restante dos países que também produz alimentos”
“De alguma forma temos falhado e isso passa pela comunicação”, afirma o professor, destacando que de 2013 a 2015, o uso de agroquímicos em território nacional caiu 12,5%. “É uma situação particular do Brasil, considerando que alguns países ” como Estados Unidos, China e Índia ” aumentaram esse consumo.”
Ainda conforme Carbonari, a aplicação de defensivos agrícolas em território nacional, considerando as áreas agrícolas, sofreu uma queda de 19,7% de 2013 a 2017. Entre os anos de 2002 e 2015, continua o professor, ao combinar o risco médio dos produtos e a dose média aplicada por hectare, houve uma queda em todas as áreas avaliadas: nos riscos para o trabalhador (-51,91%), para o consumidor (-36,88%);
Segurança alimentar e uso de defensivos
No terceiro e último painel do Fórum Internacional Inovação para Sustentabilidade na Agricultura ” “Segurança alimentar e o uso de defensivos” “, Elizabeth Nascimento, professora doutora em Toxicologia da Universidade de São Paulo (USP), também reforçou sobre a importância de se informar melhor, do ponto de vista científico, sobre o uso de defensivos agrícolas, que “na linguagem acadêmica são chamados de praguicidas”.
De acordo com ela, de modo geral, “somos ruins em comunicação quanto ao risco à população” em torno do uso de defensivos agrícolas e a concentração segura de cada um deles, especialmente sobre a diferença entre efeitos agudos (acidentes tóxicos) e efeitos crônicos relacionados à grande preocupação com produtos, de fato, cancerígenos.
Elizabeth explicou que o “perigo está relacionado à toxicidade, que é a propriedade inerente da substância em causar efeito nocivo; diferentemente do risco, que é a probabilidade de a substância produzir danos [à saúde humana] sob determinadas condições”.
“A segurança, por sua vez, é a probabilidade de a substância não produzir o dano sob determinadas condições”, salientou a professora dizendo que “não há risco zero”.
Professora doutora em Toxicologia da USP, Elizabeth Nascimento: “Somos ruins em comunicação quanto ao risco à população” em torno do uso de defensivos agrícolas e a concentração segura de cada um deles, especialmente sobre a diferença entre efeitos agudos e crônicos para a saúde humana. Foto: Shodo Yassunaga/Divulgação Andef
Para ajudar a esclarecer os efeitos dos defensivos químicos para a população, Elizabeth indicou a leite do documento do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA), elaborado pela Anvisa, e o Plano Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes (PNCRC/Animal), do Ministério da Agricultura.